MOFSF | E O RÉU VAI FALAR
16552
single,single-post,postid-16552,single-format-standard,ajax_fade,page_not_loaded,,columns-4,qode-theme-ver-10.0,wpb-js-composer js-comp-ver-4.12,vc_responsive
 

E O RÉU VAI FALAR

Imagem ilustrativa feita por

E O RÉU VAI FALAR

No finalzinho da década de 70 e início dos anos 80, comecei a escrever sobre o interrogatório do réu.

Questionava naquela época a posição geográfica ocupada no Código de Processo Penal, pelo interrogatório, no capítulo Das Provas, e como ato inaugural da instrução criminal, numa total inversão da ordem das coisas.

Sustentavam os conceituados autores e orientava a jurisprudência, ser necessário para o acusado, a narrativa contida na denúncia e nada mais.

Erro crasso.

Sustentava eu, o acusado se defende não só dos termos da inicial incriminadora, mas de toda a prova colhida sob o crivo do contraditório em juízo.

A questão tinha uma solução irrespondível: quem se defende precisa saber do que se defende e não apenas dos termos da denúncia.

E mais, advogava ser o interrogatório o último ato da instrução e não o primeiro. Deveria, se quisesse, dar sua versão com a prova constituída, sendo facultada às partes fazerem reperguntas.

Impetrei um sem número de habeas corpus, todos denegados sob a fundamentação que hoje se mostra absurda.

Peticionei outro sem número de vezes aos juízes das causas, tudo em vão.

Preciso fazer justiça a dois magistrados de 1ª Instância, hoje desembargadores, Marco Antônio Marques da Silva e Aben-Athar de Paiva Coutinho, aquele em vara comum e este no Tribunal do Júri, aceitaram minhas ponderações e ouviam o acusado por último e franqueavam as reperguntas para acusação e defesa.

Anos depois veio a reforma pontual do CPP e trouxe as mudanças pelas quais tanto lutei.

Naquela época o réu era severamente advertido de que seu silêncio seria interpretado em prejuízo de sua defesa. Hoje esse outro absurdo não existe mais.

Ajudei a pavimentar a estrada processual por onde hoje transita a defesa e o CPP.

Mas, falar ou não falar? Se falar, por que falar? Se não falar, por que não falar?

O acusado culpado ou inocente, ou mais ou menos, sofre sem qualquer dúvida quando está diante daquele que tem a caneta para condená-lo ou absolve-lo.

O juiz é um profissional, hábil em perguntar, assim como a acusação.

O acusado, não é um profissional em responder.

Quando inocente está abalado emocionalmente com a condição de réu, quer demonstrar sua inocência, quer falar. Mas, sabe falar de modo convincente?

Por outro lado quando se sente culpado, está amedrontado com o futuro, e muitas vezes, arrependido, se atrapalha. É confesso.

Sob o olhar do julgador, ou do Conselho de Sentença, e mesmo da população, a simples imputação de um crime, já o torna “culpado” ou no mínimo, “suspeito”.

Se confessa e apresenta um álibi, está mentindo, e pior, se mantém a mesma versão em outras oportunidades processuais ou não, decorou a mentira.

Quando apresenta a mesma versão, porém, com algumas diferenças, mesmo que periféricas, também mente.

Ou seja, o acusado sempre mente, independentemente de sua versão.

A prova precisa ser muito bem construída desde a fase inquisitorial, e agora com mais firmeza, porque a Lei 8.906/94, artigo 7º, inciso XXI, contempla essa possibilidade.

Durante a instrução criminal, o advogado precisa ser atento, conhecer o processo em suas minúcias e não se intimidar diante de juízes e acusadores implacáveis, que muitas vezes já estão com sua convicção formada só com a prova policial, ou mesmo, infelizmente pelos antecedentes do acusado, ou ainda pela “sua cara”.

A prova suficientemente forte para fundamentar a tese de defesa, pode desmoronar com um interrogatório ruim.

Dificilmente o interrogatório auxilia na sustentação da tese de defesa. Assim, o melhor é calar.

Mas, há outra alternativa.

O acusado faz uma declaração por escrito, obviamente assistida por seu advogado, e ela é juntada aos autos no dia do interrogatório, por petição, sustentada no artigo 231 do CPP, que autoriza a juntada de documento no processo a qualquer tempo.

O acusador vai estrilar, dizer que não pode, que não existe interrogatório por escrito de réu que não seja mudo e por aí vai.

O Juiz, quase sempre, acompanhará o acusador, ou às vezes não.

O acusado pode dizer que nega o delito, ou que agiu em legítima defesa, e que a prova do processo fala por ele, sem esquecer de falar que sua versão está detalhada no documento juntado pela defesa técnica.

O mais é pura perda de tempo.

Todavia, esse procedimento não serve para o interrogatório no plenário do júri, quando os jurados leigos é que decidirão o seu futuro.

Convém, e isso é da estratégia de cada um, responder somente as perguntas dos jurados e do seu advogado.

Seja como for, o acusado deverá se sentar o mais possível de frente para o Conselho de Sentença, para ser visto nos olhos e enxergado em sua inteireza pelos juízes leigos. E você advogado sempre fique diante dele, para saber que não está sozinho.

O interrogatório, quase sempre, é um tiro no pé da defesa.

E o silêncio nem sempre aconselhável.

Cabe a você advogado descobrir qual a melhor solução para o seu caso e para seu cliente.

Mário de Oliveira Filho, advogado criminalista, Presidente da Seccional Paulista da Assoc. Brasileira de Advogados Criminalistas

No Comments

Post A Comment